quinta-feira, 26 de abril de 2012

Retraite Scientifique


Post de Natalia Tavares

O fim dos meus 3 meses de doutorado sanduíche estão se aproximando e tive uma excelente oportunidade de descobrir que tipo de ciência é feita aqui no IPMC (Institut de Pharmacologie Moléculaire et Cellulaire – Valbonne, Sophia-Antipolis) com o “Retraite Scientifique” antes de retornar ao Brasil. Basicamente, todo o instituto se reúne num congresso onde seus estudos são apresentados de forma oral ou em pôster. Tudo se assemelha muito a um “meeting” oficial, com avaliação dos trabalhos e premiação.





A primeira coisa que me chamou atenção foi a quantidade de laboratórios envolvidos em estudos neurológicos. Desde evolução do cérebro humano até neuropatias, como autismo, epilepsia, depressão e Alzheimer, passando por interações entre sistema nervoso e imune. Nesta última área, está inserido meu orientador daqui, Nicolas Glaichenhaus (aqui):
Acredito que os cânceres eram o segundo tema mais comum, porém alguns poucos se aventuravam na biologia da divisão celular, reciclagem de receptor e doenças renais. Sim, é um instituto com temas diversos, mas praticamente nenhum com estudos em humanos. Em quase todas as apresentações apareciam os “knockouts”, quimeras e linhagens possíveis.
Uma das primeiras apresentações que se aproximam de uma das áreas de estudos do LIMI-LIP, leishmaniose, envolvia cicatrização. Roger Rezzonico, pesquisador do grupo de Pascal Barbry, estuda o perfil e função de microRNAs na cicatrização da pele. Eles observaram um acúmulo de miR-483-3p em culturas de queratinócitos humanos danificados por arranhão e também em camundongos com feridas excisionais, na fase final de fechamento da lesão. A expressão de miR-483-3p impede a proliferação de queratinócitos danificados e  seu bloqueio mantém a progressão do ciclo celular, com atraso na expressão de marcadores de diferenciação. Em modelo murino de câncer de pele, o grupo detectou 47 miRNAs com expressão alterada durante a carcinogênese. Focando em clusters significativamente reduzidos, eles mostraram que apenas 3 (miR-193b, miR-365a e miR-708) inibiam crescimento celular, migração e sobrevivência de células tumorais, reforçando sua função potencial como supressor tumoral.
No segundo dia, a primeira palestra sobre como o cérebro e o sistema imune se regulam foi ministrada por Nicolas Glaichenhaus. Sua introdução relembra que as respostas imunes são reguladas por microorganismos, morte celular, mas também por sinais dos sistemas nervoso e endócrino. Por outro lado, o sistema imune produz citocinas que regulam a função do sistema nervoso central (SNC), que tem efeitos no comportamento. Estes sinais compõem um circuito regulador que une fisiologia com condições sociais e ambientais, percebidos pelo SNC e com papel na “tomada de decisão” pelos leucócitos. Esta regulação do sistema imune mediada pelo CNS otimiza o “fitness” total do organismo e aponta novas oportunidades terapêuticas no controle de doenças infecciosas, inflamatórias e neuropsiquiátricas. Ele cita, então, um estudo muito interessante de Cao e colaboradores (DOI 10.1016/j.cell.2010.05.029), onde os camundongos são mantidos em 2 tipos diferentes de gaiolas (Fig. 1):


·      Ambiente padrão: composto por maravalha, água e ração (SE).
·      Ambiente enriquecido: com estímulos sensoriais, cognitivos, motores e sociais (EE – Fig. 1 A).
Após 3 ou 6 semanas, células de linhagem de melanoma (B16F10) foram implantadas por via subcutânea no flanco dos camundongos. 2 semanas depois, foi observada redução significativa no volume do tumor em camundongos provenientes do EE (Fig. 1 B). Além disso, a taxa de crescimento do tumor ao longo do tempo e a presença de tumor sólido visível foram reduzidas nos animais do EE.
Esta resistência ao tumor nos animais EE estava associada com alterações no eixo endócrino e resposta imune aumentada. As vias envolvidas servem como componentes de uma rede reguladora maior que influencia a resposta do hospedeiro. Não é provável que apenas uma única variável seja responsável por todos os efeitos do EE, mas é plausível que alterações no cérebro tenham um papel central em vias periféricas como efetores secundários.
Mas, como relacionar isso com o ambiente em que nós, humanos, vivemos e qual sua influência no sistema imune? E como estas vias podem ser alvos terapêuticos eficientes contra doenças infecciosas em circunstâncias tão complexas? É importante ressaltar que são descritos tipos diferentes de estresse: o “eustrese,” ou o que seria estresse positivo e o “distresse”, ou estresse negativo, associado a ambientes adversos/hostis. Este último já relacionado à disfunção de órgãos e supressão do sistema imune (McEwen et al., 2007).
Referências:
Cao, Liu, Lin, Wang, Choi, Riban, Lin and During; 2010. Environmental and genetic activation of a brain-adipocyte BDNF/Leptin axis causes câncer remission and inhibition. Cell 142, 52-64.
McEwen; 2007. Physiology and neurobiology of stress and adaptation: central role of the brain. Physiol. Rev. 87, 873-904.

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