sábado, 19 de março de 2011

Participação de bombas de efluxo de drogas da micobactéria induzidas durante a infecção do macrófago na tolerância a fármacos

ResearchBlogging.org

Post de Theolis Bessa

A resistência a fármacos tuberculostáticos é um dos grandes problemas que se enfrenta atualmente para o controle da tuberculose. Indivíduos com tuberculose resistente a fármacos estão sujeitos à falha do tratamento, ausência de negativação do escarro (o que implica no contínuo risco de transmissão) e doença mais grave, havendo a necessidade de substituição do esquema usual de tratamento por esquemas com fármacos mais agressivos e menos específicos contra o bacilo.

A vigilância para a resistência a fármacos é realizada através do cultivo dos bacilos isolados de amostras biológicas em meios contendo as drogas utilizadas no tratamento usual (drogas de primeira linha, como a isoniazida, inh, e a rifampicina, rif) ou alternativo (drogas de segunda linha, como a moxifloxacina, mox) para a tuberculose. São considerados bacilos sensíveis aqueles que não conseguem formar colônias em meio sólido ou líquido contendo concentrações definidas das drogas de interesse, e/ou que não possuam mutações já associadas à resistência a fármacos verificáveis em ensaios de amplificação de ácidos nucleicos (NAATs) [1].

Neste artigo [2], utilizando o modelo de infecção de zebrafish com Mycobacterium marinum, os autores investigam a persistência de bacilos durante o tratamento com as drogas tuberculostáticas utilizando dois regimes, monoterapia com inh e inh combinada com rif. O modelo de infecção de larvas de zebrafish reproduz o modelo humano, já que durante o tratamento bactérias persistentes podem ser evidenciadas em macrófagos infectados situados dentro e fora de granulomas, e os granulomas individuais apresentam progressão distinta, com lesões em resolução coexistindo com lesões em progressão apesar de em geral haver redução da carga bacilar. Macrófagos egressos de granulomas em resolução têm a capacidade de estabelecer novos sítios de lesão, mesmo durante o tratamento, e as bactérias em seu interior apresentam-se metabolicamente ativas, como demonstrado por ensaio utilizando bactérias fluorescentes transformadas com o gene para produção da proteína Kaede, que podem ser induzidas a mudar de cor por fotoativação.

Os autores investigam então o mecanismo de surgimento desta tolerância sob tratamento com fármacos em estágios tão iniciais da infecção. Eles demonstram que a residência intramacrofágica induz o aumento da tolerância in vitro de M. marinum e M. tuberculosis simultaneamente à inh, à rif e a mox, comparando a sobrevivência a estes fármacos de micobactérias mantidas por 2h e por 96h no interior de macrófagos, tanto por tratamento das culturas de macrófagos como por tratamento direto das bactérias após a lise das células hospedeiras. As micobactérias retêm a tolerância às drogas mesmo mantidas por até 120h após a lise dos macrófagos. Neste sistema a aceleração da multiplicação de M. mariunum por adição de dexametasona aumentou ainda mais a população de bactérias resistentes. Por outro lado, a marcação de micobactérias em divisão com o plasmídio instável pBP10 mostrou não haver desaceleração do crescimento micobacteriano durante a infecção por 96h. Além disso, as populações micobacterianas que não retiveram o plasmídeo (evidência de pelo menos 1 ciclo de replicação, fig. D) tinham proporção aumentada de organismos tolerantes aos fármacos, sugerindo que, ao contrário do pensamento corrente, o surgimento da resistência não está associado a populações quiescentes do bacilo.

Finalmente, os autores demonstram o papel da indução de bombas de efluxo de drogas nos bacilos durante a residência intramacrofágica na tolerância a múltiplas drogas observada nos experimentos descritos. Eles demonstram que o uso de inibidores de bombas de efluxo de drogas (verapamil e reserpina), já demonstrados em humanos como capazes de aumentar a atividade de fármacos no tratamento contra a tuberculose resistente a drogas, é capaz de reduzir a tolerância elicitada tanto em M. marinum como em M. tuberculosis durante a infecção de macrófagos. O tratamento de macrófagos infectados com verapamil também é capaz de reduzir o crescimento dos bacilos (fig. F). Os autores implicam a bomba de efluxo de drogas MtbRv1258c como uma das moléculas que mediam este fenômeno, utilizando bactérias com inserções de transposons em diferentes pontos da sequência Rv1258c.

Os achados descritos não só adicionam conhecimento sobre os mecanismos de geração de tolerância às drogas tuberculostáticas, mas também abrem a perspectiva de uso de novas classes de drogas como auxiliares no tratamento da tuberculose e prevenção da resistência.




D: M. marinum com o plasmídeo instável pBP10 foram utilizados para infectar macrófagos. Os macrófagos hospedeiros foram lisados após 96h e foram então tratados por mais 48h com INH 174 mM, RIF 1.21 mM, MOX 7.48 mM, ou deixados sem tratamento. O número de CFUs de bacilos totais e de bacilos resistentes à kanamicina (KanR que mantiveram o plasmídeo) foi determinado por contagem e o número deCFUs de bacilos sensíveis foi deduzido por subtração. As barras de erro representam o desvio-padrão da média e os valores de p foram detrminados utilizando teste t de Student.

F: Células THP-1 foram infectadas com M. marinum por 48h antes da adição de 0 (UNT), 40.7, ou 81.4 mM de verapamil por mais 48h. p<0.001 utilizando one-way ANOVA com pós-teste de Dunnett, comparando cada grupo tratado com o grupo não tratado após 48h de tratamento com verapamil.


Referências:


[1] Centers for Disease Control and Prevention, Controlling Tuberculosis in the United States: Recommendations from the American Thoracic Society, CDC, and the Infectious Diseases Society of America, MMWR Morb. Mortal. Wkly. Rep. 54 (2005) 1-81.

[2] Adams, K., Takaki, K., Connolly, L., Wiedenhoft, H., Winglee, K., Humbert, O., Edelstein, P., Cosma, C., & Ramakrishnan, L. (2011). Drug Tolerance in Replicating Mycobacteria Mediated by a Macrophage-Induced Efflux Mechanism Cell DOI: 10.1016/j.cell.2011.02.022

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